Com o tempo, a Ville l’Évêque se desenvolve, assim como o bairro vizinho Saint-Honoré (Faubourg Saint-Honoré). Então, a pequena igreja gótica fica pequena para acolher todo mundo. É decidida a construção de uma nova paróquia, em estilo clássico. Em 1659, a primeira pedra é colocada por Anne-Marie Louise d’Orléans, conhecida como a Grande Mademoiselle. Mas ainda não é a “nossa” Madeleine. Essa do século XVII ficava onde hoje é o começo do Boulevard Malesherbes. Ela vai servir de paróquia até a Revolução.
A rue Royale vista a partir da Madeleine
O arquiteto escolhido é Pierre Contant d’Ivry, que havia participado da construção do Palais Royal e, em 1763, Louis XV coloca a primeira pedra. Mas aí, como em várias igrejas de Paris, a construção vira uma novela. A igreja só vai ser inaugurada, ou melhor, consagrada, quase oitenta anos depois.
A parte de trás da igreja
Para começar, já no ano seguinte do começo da construção, em 1764, os trabalhos são interrompidos. Pouco depois são retomados. Mas aí é o arquiteto que morre, em 1777. Um de seus aprendizes, Joseph-Abel Couture assume a obra e a toca até 1789. Ele modifica o projeto inicial, que era bem inspirado no Invalides (Inválidos), diminuindo a nave para aumentar o coro. Constrói os pórticos e as paredes. É dele a ideia de multiplicar as colunas no edifício, símbolo da arquitetura clássica (baseada na Antiguidade) que estava na moda na época.
Mas chega o ano de 1789 e, com ele, a Revolução Francesa, e ninguém sabe o que fazer com a construção. Como os revolucionários são anticlericais, uma igreja está fora de cogitação. Pensam, então, em fazer uma sala para a Assembleia, ou um banco, uma biblioteca, Bolsa de Valores, Ópera, Tribunal de Comércio, e por aí vai. Em 1791, decidem por suspender a obra.
Em 1799, a antiga igreja, aquela do Boulevard Malesherbes, é demolida. Em 1802, uma igreja ali perto, Église de Notre-Dame de l’Assomption, na rue Saint-Honoré, é transformada na paróquia do bairro (pois a antiga, como acabamos de ver, foi destruída). Enquanto isso, a obra do novo edifício continua parada.
Mas Napoleão chega ao poder. E em 1806, ele deseja utilizar o canteiro parado para fazer um templo dedicado à glória do exército. Então, ele promove um concurso com 82 arquitetos para terminar a obra. Mas, no final, ele não respeita a decisão do júri e impõe Pierre-Alexandre Vignon como arquiteto-chefe do projeto. Ele transforma tudo: somente as colunas são poupadas. Aliás, multiplicadas novamente, agora toda a fachada externa é cercada por elas. A estética é de um verdadeiro templo romano.
Com a derrota de Napoleão, em 1815, o rei Louis XVIII resolve devolver a função religiosa ao edifício. Em 1828, Vignon morre e Jean-Jacques-Marie Huvé é o novo arquiteto. A construção é lenta por causa de problemas de dinheiro. Com a Monarchie de Juillet (Monarquia de Julho), pensam em usar a igreja como um templo de reconciliação nacional, ideia que é abandonada.
A construção finalmente avança: Huvé resolve colocar, nas fachadas, nichos com estátuas, contrariando o antecessor que queria paredes nuas. O frontão é esculpido e o interior decorado. Isso tudo com os melhores artistas da época. A ideia era fazer um templo suntuoso, para promover uma espécie de reconciliação do Cristianismo com o Estado e a sociedade (depois das turbulências da Revolução). Em 1842, a igreja tem uma primeira inauguração. E em 1845 é inaugurada solenemente, 82 anos depois da primeira pedra.
Visitando a igreja
A Madeleine nem de longe parece uma igreja. Para começar, ela não tem sino. Depois, sua arquitetura mais parece de um templo romano e o interior tem o formato das salas das termas romanas. O que faz lembrar que é uma paróquia católica são as esculturas e pinturas, tanto no exterior quanto no interior da igreja. Vamos ver algumas delas agora?
Frontão – Foi esculpido por Henri Lemaire, em 1833. Ele mostra o Julgamento Final. O Cristo está no centro. À sua direita, as virtudes com os escolhidos. E à sua esquerda (direita para nós), está São Michel, que expulsa os condenados. Maria Madalena se encontra entre eles, ajoelhada, como se pedindo pelas suas almas. Acima da cena, uma inscrição em latim diz: Ao Deus todo-poderoso, sob a intercessão de Maria Madalena. O mais interessante é que para fazer o frontão foi feito um concurso com 27 concorrentes.
Portas de bronze – Foram feitas em 1837 e colocadas em 1841. Foram realizadas por Henri de Tiqueti. Uma curiosidade é que o artista era barão e esculpia por prazer. Mas o sucesso que ele teve nos salões de Belas-Artes da época fez com que recebesse a encomenda do Estado para fazer as portas da Madeleine. Elas retratam Moisés e os dez mandamentos, representados em pequenas cenas. É uma obra-prima da arte do Romantismo.
As estátuas das fachadas – Foi ideia de Huvé. A estátua de João Evangelista foi feita por Joseph Coupon, mas para as outras 33 estátuas foram contratados 30 escultores diferentes. Elas são maiores do que o tamanho natural e, além dos santos mais populares na França da época, contam com padroeiros da família Orléans, que estava no poder. Duas coisas curiosas – primeira: uma das mulheres, Jeanne de Valois já é mostrada como santa um século antes da sua canonização. E a segunda: na fachada posterior estão os quatro evangelistas, mas são Lucas está sem a cabeça, arrancada por uma bala de canhão alemão em 1918.
Jeanne de Valois
O interior da Madeleine é muito luxuoso, com muito mármore e dourado. É uma pena que a iluminação precária da igreja não nos deixe ver – e nem fotografar – direito essas maravilhas. A luz vem de cima, através das cúpulas, e onde Vignon havia previsto construir janelas, Huvé optou por pintar seis painéis da vida de Maria Madalena, cada um deles feito por um artista diferente.
O afresco da abside – Foi feito entre 1835 e 1837 por Jules-Claude Ziegler. Ele retrata a história do Cristianismo, com o Cristo no meio, o Oriente à direita e o Ocidente à esquerda. Jesus é cercado pelos apóstolos e, abaixo deles, como em uma pirâmide, vários personagens. Maria Madalena está em uma nuvem carregada por três anjos. O mais curioso é, que dentre a multidão, estão representadas várias personalidades que fizeram a história.
Por exemplo, na parte do Oriente, o foco são as cruzadas e os personagens que fizeram parte dela, – como São Luis (Louis IX), rei da França, e Ricardo Coração de Leão, rei da Inglaterra -, além de vários nobres, clérigos e até o imperador Constantino. Nessa parte, há também um episódio contemporâneo a construção da igreja: a guerra da independência da Grécia, simbolizada por um cadáver que caído. Na parte do Ocidente, os primeiros santos e mártires, Clovis – o primeiro rei da França, e – o mais curioso – Dante, Rafael e Michelângelo representando o Renascimento. No centro da “multidão”, entre Oriente e Ocidente, Napoleão sendo coroado pelo papa Pio VII.
Mosaico – Foi colocado, por decisão dos fieis, em 1888, bem depois da inauguração. O autor é Charles-Joseph Lameire e foi executado por Auguste Guilbert Martin. Para ter uma ideia da riqueza da obra, as peças em vidro foram feitas pela Manufatura de Sèvres. Ele mostra o Cristo Ressuscitado e liga Maria Madalena à Marta e Lázaro, que seria o fundador da igreja em Marseille. Também há outros personagens que teriam seguido Madeleine até a França e fundado igrejas em diversas regiões. Aqui vai mais uma curiosidade: várias das figuras possuem feições de figuras ilustres, como Charles Garnier – arquiteto da Ópera de Paris – e o próprio Lameire.
Logo abaixo, outra obra: painéis de Vincent-Nicolas Raverat, que alternam figuras de anjos e santos. Neles estão representados, entre outros, Santa Cecília, São Pedro e São Paulo e, novamente, alguns padroeiros da família Orléans, como Saint Philippe e Sainte Amélie.
Ravissement de Sainte Marie-Madeleine (Arrebatamento de Santa Maria Madalena) – Foi realizada por Charles Marochetti e levou 12 anos para ser esculpida, ficando pronta só em 1857. É o retábulo do altar. A cena principal mostra a santa carregada por três anjos em seu êxtase final.
As estátuas da Nave – A Madeleine não possui capelas laterais, como a maioria das igrejas de Paris. Mas há seis altares laterais, cada um com uma grande estátua em mármore branco, feita cada uma por um artista diferente. Dentre a Virgem, o Cristo, São Vicente e Santo Agostinho, duas santas francesas: Sainte Amélie, feita por Théophile François Bra, em homenagem a rainha Marie-Amélie; e Santa Clotilde, primeira rainha francesa.
As capelas do vestíbulo – Logo que entramos na igreja, uma de cada lado: o Batismo de Cristo, de François Rude, e o Casamento da Virgem, de James Pradier. Ambas são de 1843 e feitas com mármore de Carrara
O batismo de Cristo
O casamento da Virgem
Há ainda na igreja uma imagem de Joana d’Arc, de 1909, anterior à sua canonização, feita por Raoul Larche. Para terminar, uma última curiosidade: em 1781, Louis XVI extrai um fragmento do osso atribuído a Maria Madalena de um relicário no sul da França. Ele dá o “presente” ao duque de Parma. Passam os anos, e, em 1824, Louis XVIII recebe uma parte da relíquia da Itália e dá para a paróquia. O relicário pode ser visto no altar, junto com um de São Vicente, este último de 1846 (um de cada lado do altar).
Enfim, isso tudo é o que te espera se você subir os 28 degraus da entrada para visitar a Madeleine. E eu aconselho você que realmente o faça. É uma igreja diferente e esse texto não mostra nem 10% da beleza que tem lá.
Igreja de la Madeleine
Place de la Madeleine
75008 Paris
Metrô Madeleine – linhas 8, 12 e 14
Horários: todos os dias, das 9h30 às 19h
Place de la Madeleine
75008 Paris
Metrô Madeleine – linhas 8, 12 e 14
Horários: todos os dias, das 9h30 às 19h
fonte:http://diretodeparis.com/wp-content/uploads/2015/01/DSC08801-1.jpgdiretodeparis.com/madeleine-a-igreja-que-nem-parece-igreja/
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